Brasil: Milhões doados para testes transferidos para programa da primeira-dama
- Adeildo Velôso da Silva
- 2 de out. de 2020
- 3 min de leitura
O Governo brasileiro transferiu 7,5 milhões de reais , inicialmente doados para a compra de testes da covid-19, para o programa Pátria Voluntária, liderado pela primeira-dama, Michelle Bolsonaro, noticiou hoje a Folha de São Paulo.

O jornal teve acesso a documentos da Marfrig, uma das maiores produtoras de carne bovina do Brasil, que em Março último anunciou a doação de 7,5 milhões de reais ao Ministério da Saúde para a compra de 100 mil testes rápidos do novo coronavírus, no momento em que o país estava com falta de material e era um dos que menos testava a sua população.
Contudo, apesar de o executivo ter garantido que a verba seria usada especificamente na compra de testes para deteção do vírus, a situação alterou-se após a companhia ter transferido o dinheiro.
Segundo a Marfrig relatou ao jornal, quando o montante doado já se encontrava na posse do Governo brasileiro, presidido por Jair Bolsonaro, o Ministério da Casa Civil consultou a companhia sobre a possibilidade de utilizar a verba em outras ações de combate à pandemia.
A empresa diz ter sido então consultada "sobre a possibilidade de destinar a verba doada não para a compra de testes por parte do Ministério da Saúde, mas para outras ações de combate aos efeitos socioeconómicos da pandemia de covid-19, especificamente o auxílio a pequenos negócios de pessoas em situação de vulnerabilidade".
"Como a ação estava diretamente ligada à mitigação dos danos causados pela pandemia, a Marfrig concordou com o novo destino dos recursos doados", admitiu a companhia.
Os recursos foram então destinados ao projeto Arrecadação Solidária, vinculado ao Pátria Voluntária, de Michelle Bolsonaro.
Segundo a Folha de São Paulo, o programa liderado pela primeira-dama do Brasil transferiu o dinheiro do Arrecadação Solidária, sem edital de concorrência, para instituições missionárias evangélicas aliadas da ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, para a compra e distribuição de cestas básicas (cabazes de compras com alimentos e produtos de higiene).
De acordo com a Casa Civil, o dinheiro foi usado para a compra e distribuição de cestas básicas a mais famílias mais vulneráveis à pandemia.
Os 7,5 milhões de reais doados pela Marfrig representam quase 70% do total arrecadado pelo programa Pátria Voluntária até ao momento: 10,9 milhões de reais , dos quais 4,3 milhões de reais foram aplicados até agora sem um edital público.
Criado em Julho do ano passado, o programa liderado por Michelle Bolsonaro tem como objetivo fomentar a prática do voluntariado e estimular o crescimento de organizações sem fins lucrativos, arrecadando dinheiro de instituições privadas e transferindo-o para organizações sociais.
O programa em causa já consumiu cerca de nove milhões de reais dos cofres públicos em publicidade pagos pela Secretaria de Comunicação Social da Presidência.
Duas organizações filiadas à AMTB também receberam verbas de doações sem que houvesse um edital público. O Instituto Missional, com R$ 391 mil, e o SIM (Serviço Integrado de Missões), com R$10 mil.
A AMTB e o Missional foram as que receberam os maiores repasses até agora. Todos os recursos foram destinados a distribuição de cestas básicas "a famílias vulneráveis".
O presidente da AMTB , Paulo Feniman, disse que a organização não funciona mais no local apontado pelo site e que este poderia estar desatualizado. O endereço foi retirado do site após o contato da reportagem. Ele justificou que "por ser uma associação, a AMTB só tem endereço fiscal".
Procurada, a Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência não respondeu sobre quais os critérios utilizados para estas entidades receberem os recursos e nem sobre a relação entre as ONGs.
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